Introdução
Os prazos de carência são uma das principais fontes de dúvidas e conflitos entre beneficiários e operadoras de planos de saúde. Em muitos contratos, quando o paciente ainda está cumprindo carência e precisa de internação, a cobertura é concedida apenas por 12 horas. Depois disso, o indivíduo deve recorrer ao SUS ou arcar com os custos da internação por conta própria.
Mas será que essa limitação de 12 horas, imposta por algumas operadoras, é realmente legal? Neste artigo, vamos responder a essa questão de forma completa, analisando a Resolução do Conselho de Saúde Suplementar (CONSU) nº 13/98, a Lei nº 9.656/98 e a jurisprudência que respalda o direito do paciente à internação integral quando há urgência ou emergência, mesmo durante o período de carência.
Entendendo a Limitação de 12 Horas: Mito ou Realidade?
Para muitos beneficiários, é um choque descobrir que seu plano de saúde, em teoria, oferece apenas as primeiras 12 horas de internação em casos de urgência. Essa prática se baseia na Resolução CONSU nº 13/98, que dispõe sobre os atendimentos de urgência e emergência para contratos exclusivamente ambulatoriais. Nesse tipo de plano, de fato, não há cobertura para internações prolongadas.
Entretanto, há um parágrafo controverso no artigo 3º da CONSU 13 que amplia essa limitação para os planos de saúde com cobertura hospitalar quando o beneficiário está em carência. É justamente essa extensão que gera muitos conflitos, pois fere princípios legais mais amplos, como o direito à saúde e à vida, sem restrições ilegais de tempo ou custo.
Por que isso acontece?
A ANS buscou regulamentar a cobertura em casos de urgência e emergência.
O texto da resolução acabou extrapolando seu escopo, ao afirmar que, durante a carência, o paciente em contrato hospitalar também estaria limitado a apenas 12 horas de internação.
Contudo, essa interpretação contraria a Lei nº 9.656/98, que rege os planos de saúde em todo o país. Como veremos ao longo deste artigo, a lei não admite limitação de tempo de internação em situações de urgência ou emergência para contratos com segmentação hospitalar.
O Que Diz a Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/98)?
A Lei 9.656/98 é a principal legislação que regula os planos de saúde no Brasil. Entre outras disposições, ela prevê:
- Cobertura de 24 horas para Urgências e Emergências: A partir do momento em que o contrato entra em vigor, o paciente já tem direito ao atendimento emergencial em até 24 horas.
- Proibição de Limitação de Prazo e Quantidade de Internação: No caso dos planos hospitalares, não pode haver restrição de tempo para internações necessárias, sobretudo se configurado risco à vida ou lesão irreparável.
- Hierarquia de Normas: Nenhuma resolução ou instrução normativa pode se sobrepor ao texto legal. Isso significa que regras editadas por órgãos reguladores, como a ANS, não podem contrariar dispositivos previstos em lei federal.
Em outras palavras, quando ocorre um quadro de urgência ou emergência, e o médico atesta a necessidade de internação hospitalar, não pode haver limitação temporal: a internação deve durar o quanto for necessário à recuperação do paciente.
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CONSU 13/98: O que Ela Prevê e por que É Polêmica
Publicada em 1998, a CONSU 13 estabeleceu normas para o atendimento de urgência e emergência nos planos de saúde. Em seu artigo 2º, definiu que as operadoras de planos exclusivamente ambulatoriais deveriam cobrir até 12 horas de atendimento em caso de urgência/emergência. Isso se justifica porque, em contratos que não incluem cobertura hospitalar, não haveria, em tese, direito a internação prolongada.
No entanto, o §1º do art. 3º da mesma resolução estendeu esse limite aos planos hospitalares em carência, determinando que, até o fim do período carencial, o paciente teria cobertura similar à prevista nos planos ambulatoriais. Ou seja, ficaria restrito às 12 horas iniciais de internação.
Por que a Regra É Ilegal para Planos Hospitalares?
- Contrariedade à Lei 9.656/98: A lei federal não permite limitação de internação em caráter de urgência ou emergência.
- Excesso de Poder Regulamentar: Ao incluir no artigo 3º um trecho que estende a limitação aos contratos hospitalares, a CONSU extrapolou a competência regulatória da ANS, que não pode criar regras contrárias à lei.
- Prejuízo ao Consumidor: A limitação de 12 horas coloca em risco a vida e a saúde dos beneficiários que, muitas vezes, necessitam de internação prolongada em caso de gravidade.
Carência para Internação: Quais São os Prazos Legais?
Em condições normais, sem urgência ou emergência, o prazo de carência para internações eletivas em um plano de saúde pode chegar a 180 dias. Porém, quando há risco imediato de vida ou de lesão irreparável (situação de urgência ou emergência), a lei reduz drasticamente esse prazo para apenas 24 horas após a contratação do plano.
Prazos de Carência Estabelecidos pela Lei 9.656/98
- Urgência e Emergência: 24 horas a partir da contratação.
- Consultas e Exames Simples: 30 dias.
- Internações Hospitalares Eletivas e Cirurgias: 180 dias.
- Parto a Termo: 300 dias.
- Doenças e Lesões Preexistentes: até 24 meses para procedimentos de alta complexidade relacionados à patologia preexistente.
Logo, mesmo que o período de carência para internações eletivas não tenha terminado, a lei assegura que, em casos emergenciais, a operadora deve prestar assistência de forma integral, sem restringir a internação às primeiras 12 horas.
Leia mais: https://freitasetrigueiro.com.br/carencia-em-urgencia-no-plano-de-saude-e-de-24-horas-saiba/
Quando o Prazo de Carência Pode Ser Afastado?
O prazo de 180 dias de carência para internações pode ser afastado em circunstâncias que configuram urgência ou emergência, tais como:
- Acidentes Pessoais: Se o paciente sofrer um acidente grave, o médico deve justificar a internação imediata.
- Complicações Gestacionais: Quando há risco para a mãe ou para o feto.
- Emergências Médicas: Envolvendo risco à vida ou risco de dano irreparável (por exemplo, risco de perda de um membro).
Em todas essas situações, não cabe a limitação das 12 horas de internação se o contrato do paciente inclui cobertura hospitalar.
Internação de Urgência em Contratos Ambulatoriais: Como Funciona?
Planos Exclusivamente Ambulatoriais
Oferecem cobertura para consultas, exames e procedimentos realizados em ambulatório, sem contemplar a internação hospitalar prolongada.
Regra das 12 Horas
Nesses casos, a CONSU 13/98 autoriza a cobertura emergencial somente até 12 horas de atendimento. Findo esse prazo, se o paciente precisar continuar internado, torna-se responsável por suas despesas ou deve ser encaminhado ao SUS.
Aqui, a limitação não é considerada abusiva, pois o contrato não prevê cobertura hospitalar. Entretanto, quando se trata de um plano hospitalar, a regra de 12 horas fere a Lei 9.656/98, que proíbe restrições de tempo para internações de urgência.
Entenda a Visão dos Tribunais
A Justiça brasileira, na maioria das decisões, declara que é ilegal impor limite de 12 horas para a cobertura de internações urgentes em planos de saúde do tipo hospitalar. Isso acontece porque a própria Lei 9.656/98 proíbe expressamente a limitação de tempo, valor ou quantidade de internações quando há indicação médica de urgência/emergência.
Exemplo de Decisão Judicial
Em muitos casos, há decisões que beneficiam inclusive pacientes em período de carência, determinando que o plano de saúde arque com toda a internação. Por exemplo:
“É abusiva a negativa de cobertura sob alegação de carência, quando a hipótese é de urgência ou emergência, pois a limitação criada pela CONSU 13/98 extrapola o poder regulamentar e contraria a Lei 9.656/98, que não admite limitação de tempo de internação em casos emergenciais.”
Decisões nesse sentido são reiteradas, principalmente nos Tribunais de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e do Rio de Janeiro (TJ-RJ), além de jurisprudências firmadas no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Tal compreensão visa proteger o consumidor em situações de fragilidade, conforme o Código de Defesa do Consumidor.
O Que Fazer se o Plano de Saúde Recusar a Internação?
Se o plano de saúde insistir em impor a limitação de 12 horas, aconselha-se:
- Buscar Aconselhamento Médico: Tenha um relatório ou atestado que comprove a urgência/emergência e a necessidade de internação prolongada.
- Permanecer em Hospitais da Rede Credenciada: Isso facilita a comprovação de que você buscou atendimento dentro das regras do contrato.
- Procurar um Advogado Especialista em Direito à Saúde: Esse profissional analisará o seu caso e definirá estratégias para acionar a operadora administrativamente ou judicialmente.
- Ingressar com Ação Judicial e Pedido de Liminar: Em caráter emergencial, os juízes costumam conceder liminares que obrigam o plano a cobrir a internação, pois a vida do paciente está em risco.
- Guardar toda a Documentação: Negativas de cobertura por escrito, relatórios médicos, laudos e provas de que a operadora se negou a custear a internação. Esse conjunto de evidências é fundamental.
A liminar ou “tutela de urgência” permite que o paciente receba atendimento completo sem ter que aguardar o término do processo, que pode levar meses ou anos. Esse mecanismo é vital para garantir a continuidade dos cuidados de saúde em caso de risco de vida.
Esse Tipo de Ação É Causa Ganha?
Nenhum caso judicial é “causa ganha” de forma absoluta. Cada situação contém suas particularidades, e o juiz avaliará minuciosamente a urgência, os documentos, o histórico clínico do paciente e as cláusulas contratuais. Entretanto:
- A jurisprudência é amplamente favorável aos beneficiários, pois reconhece a ilegalidade de limitar a internação em 12 horas em planos hospitalares.
- A existência de relatórios médicos que atestem a urgência/emergência aumenta as chances de êxito.
- Um advogado especializado em Direito à Saúde consegue direcionar os argumentos de modo consistente e alinhado à jurisprudência.
Por Que Falar com um Advogado Especialista em Direito à Saúde?
Advogados especializados entendem detalhadamente as leis e regulamentações que envolvem a saúde suplementar, como:
- Lei 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde)
- Código de Defesa do Consumidor (CDC)
- Resoluções da ANS e do CONSU
- Precedentes e jurisprudências nos tribunais estaduais e no STJ
Isso é crucial para:
- Identificar rapidamente a ilegalidade na conduta do plano de saúde.
- Agir com celeridade para obter liminares em caráter emergencial.
- Redigir petições de modo a demonstrar claramente o direito do paciente, a gravidade do caso e o descumprimento das normas pela operadora.
Além disso, o acompanhamento de um advogado especializado é fundamental para orientar os procedimentos e resguardar os direitos do beneficiário. Um especialista confere segurança ao paciente, pois muitas vezes ele se encontra em situação de vulnerabilidade e precisa de orientações rápidas e eficazes para obter o tratamento necessário.
Conclusão: Não Aceite Restrições Indevidas de Internação
Limitar a internação a 12 horas em contratos que oferecem cobertura hospitalar é uma prática ilegal. A Lei nº 9.656/98 deixa claro que, em situações de urgência ou emergência, deve haver cobertura integral a partir das primeiras 24 horas do contrato, sem qualquer limitação de tempo, valor ou quantidade de diárias.
Portanto, se o seu plano de saúde negar a extensão da internação sob o argumento de carência ou de uma suposta regra que a limita a 12 horas, você tem o direito de contestar essa decisão. A busca de ajuda jurídica especializada tende a ser decisiva para reverter a negativa da operadora e garantir o atendimento necessário.
Perguntas Frequentes (FAQ)
A limitação de 12 horas de internação é válida para todos os planos?
Não. Ela se aplica somente aos planos exclusivamente ambulatoriais, que não contemplam internações. Para planos hospitalares, essa limitação é ilegal quando se trata de urgência ou emergência, mesmo em período de carência.
O que é considerado urgência ou emergência?
Segundo a Lei 9.656/98, situações de urgência e emergência são aquelas que envolvem risco imediato de vida ou lesões irreparáveis caso não haja atendimento rápido. Exemplos: acidentes graves, infartos, complicações gestacionais severas etc.
Se o médico atestar urgência, mas o plano negar a cobertura, o que fazer?
É recomendado procurar imediatamente um advogado especialista em planos de saúde para avaliar a possibilidade de ação judicial com pedido de liminar, garantindo a continuidade da internação.
Quais documentos devo juntar para acionar judicialmente o plano de saúde?
- Negativa de cobertura por escrito da operadora;
- Relatório médico explicando a urgência e a necessidade de internação;
- Documentos pessoais (RG, CPF, carteirinha do plano);
- Comprovantes de pagamentos (para planos individuais ou familiares).
O SUS pode se recusar a receber pacientes encaminhados por planos privados?
Não. O SUS atende qualquer pessoa, mas o ideal é que o beneficiário não seja direcionado ao SUS em casos em que o plano de saúde tem a obrigação legal de prestar assistência. Se há recusa do plano, a via judicial pode ser a solução para obrigá-lo a cumprir o contrato.
A liminar sai em quanto tempo?
Depende do tribunal e da região, mas, em casos de urgência real e devidamente comprovada, as liminares costumam ser analisadas em poucos dias, podendo até sair em horas, dependendo da gravidade.
E se eu estiver cumprindo carência para procedimentos não emergenciais?
A carência de 180 dias para internações eletivas continua valendo. Entretanto, em casos de urgência ou emergência, esse prazo não se aplica, pois a lei determina cobertura após 24 horas da contratação do plano.